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coluna Domingando [2021, junho/20]

por Paulo Conceição Rocha


Confesso, sou viciado em neologismos. Outro dia descobri o melhor de todos: “meulogismos”, um dicionário de palavras inexistentes (ou ex-inexistentes?), como define seu criador Carlos Castelo (a quem não conhecia, antes de parar no link de um artigo do Estadão). Compartilho do sentimento. E não me canso. Um dos meulogismos é o “rubricário”, a saber, uma coleção insana de perfis de tudo quanto é coisa, de personagens a paisagens, de cenas aleatórias a tópicos diversos sobre algo que logo mais, certamente, esquecerei... uma maçaroca de ideias. Outro é o “dutismo”, uma tentativa de representar a literatura acidental, essa que nasce de onde menos esperamos, inclusive do bendito lugar comum.


Eis o dutismo, pois estamos nos tornando canais para outro tipo de inteligência. Aquela, a artificial. No lugar de usadores de ferramentas, seremos em breve a própria ferramenta. A saber... além do analfabetismo comum, o político, o funcional e o tecnológico, a Era Digital (que está em acelerado processo de estabelecimento de fronteiras) trará consigo o analfabetismo total. Sem recursos (porque informações deixarão de ser informações) e sem crítica (porque a ideia de conceito vai se transformar em outra coisa), muita gente vai acabar se baseando só nos canais/dispositivos para pensar, criar, viver. Muita gente mesmo. É a macro-inteligência artificial (independente dos robôs) dominando liberdade, desejo e a mínima chance de transgressão. Não que o povo seja privado de instrumentos. Mas é que os instrumentos não contribuem mais a nada de edificante. Algo como a parábola do peixe, da vara e do ensinar a pescar, porém agora se a vara (digital) decidir que o melhor é furar um buraco na areia, o pescador aceitará. Ele é quem será o instrumento, refém de uma nova linguagem metafática, quando testamos os canais eternamente mas nunca enunciamos algo inteligível: alô, som, alô, som... analfabetos totais, paradoxalmente satisfeitos com a ilusão de segurança no acidente, sem precisar pensar. Enquanto isso, o peixe (desejo) agora estará ressignificado, nadando tranquilamente por águas estranhas. Pobre humanidade!

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